Inês Gonçalves; Filomena Mina;
Centro de Saúde do Santo da Serra
Prevenir é o melhor remédio. E se antes ainda havia dúvida, a pandemia veio mostrar que o básico faz a diferença. Vivemos tempos incógnitos, desafiantes e de incerteza. Mas no meio de tudo o que não sabemos há sempre aquilo que não muda. E enquanto nos concentramos no combate deste novo vírus, não podemos esquecer todas as outras patologias que matam em Portugal. O SARS-CoV-2, responsável pela doença COVID-19, mostrou-nos que lavar as mãos salva vidas. Sabem o que também salva vidas? Uma alimentação saudável e a prática de atividade física.
Todos os dias, enquanto médicos de família, tentamos convencer os nossos utentes que a diferença está no mais simples e que a base é a alimentação. Em Portugal, cerca de 35 mil pessoas morrem anualmente por doença cardiovascular, que continua a ser a principal causa de morte, responsável por 1/3 da mortalidade da população. A alimentação inadequada é responsável por cerca de metade das mortes causadas pelas doenças cardiovasculares. Na Região Autónoma da Madeira o panorama é semelhante. Em 2018 as doenças do aparelho circulatório foram a principal causa de morte com 28,9% do total de óbitos, com destaque para as doenças cerebrovasculares, o Acidente Vascular Cerebral (AVC), responsável por 8,7% do total de óbitos.
Os cuidados de saúde primários têm como principal foco a prevenção, prevenir a doença e promover a saúde. Promovemos ideias simples, mas que acabam por ser as mais complexas. Repetimo-nos tantas vezes nos nossos ensinos que os nossos utentes muitas vezes já não nos escutam. Sabemos que a diabetes não dói, pelo menos não inicialmente. Sabemos também que o sal é intrínseco a ser-se português, assim como a comida bem temperada e com sustento. Recorremos a fármacos pela sua evidência em controlar estas patologias, em diminuir a mortalidade cardiovascular. No entanto, é no simples que reside a máxima eficácia: a alteração dos estilos de vida.
A Direção Geral de Saúde (DGS) aconselha pelo menos 30 minutos diários de atividade física moderada, uma redução no consumo de sal para menos de 5g /dia, um aumento do consumo de frutos, legumes e vegetais (pelo menos 400g /dia), redução do consumo total de gorduras para valores entre 15 a 30% da ingestão calórica diária, redução do consumo excessivo de álcool (1 copo pequeno, por dia, para as mulheres e 2 copos pequenos, por dia, para os homens) e a evicção do tabaco. O cumprimento destes conselhos está para a patologia cardiovascular como o isolamento social para a COVID-19. Mudar de hábitos implica treino e disciplina, acima de tudo exige vontade e a capacidade de perceber o ganho que está na mudança.
Os dados mostram que estamos a conseguir achatar a curva nesta guerra contra um vírus que conhecemos há poucos meses. Com a mesma vontade conseguimos um feito semelhante nas patologias que conhecemos há tantos anos.
Qualidade de vida talvez nunca fez tanto sentido. E se por agora temos que ficar distantes, tentemos ficar cá por mais tempo quando finalmente nos pudermos abraçar.